Foi a segunda vez que o magoei, a primeira foi no dia 20 de Janeiro de 2013, quando estava em trabalho de parto, cada vez que eu tinha uma contracção ele ficava sem ar, o cordão umbilical enrolou-se à volta do pescoço dele, e foi uma hora de verdadeiro terror até ele nascer, só quando o ouvi chorar é que descansei.
A segunda foi ontem, quem visita a outra barraca, já sabe mais ou menos o que se passa, a minha lontra está doente, tem uma amigdalite viral (uma coisa normal para os putos que estão nas creches), mas a minha lontra é especial, é alérgica a um antibiótico chamado clamavox, que é basicamente o antibiótico mais usado nas crianças, pois trata todo o tipo de infecções e para além disso é um dos componentes da penicilina, o que o faz altamente alérgico também a isso. E por isso na sexta feira, foi-lhe receitado um antibiótico de outra gama, mas mais forte, não tão recomendável para crianças. Viemos para casa com dois avisos, caso a febre não baixasse ou se ele tivesse vómitos sistemáticos, que tínhamos que lá voltar.
No sábado, depois do almoço ao dar-lhe o medicamente para a febre, sem querer fiz com que ele vomitasse, fiquei com o coração nas mãos.
A muito custo passei a tarde a tentar convence-lo a comer e a tomar a medicação. À noite decidi que era melhor ele dormir comigo, era mais fácil de lhe controlar a febre. Ele esteve bem, até às cinco e meia da madrugada, acordamos e ele pediu-me leite, dei-lho e vi-lhe a febre, já estava nos quarenta, dei-lhe a medicação e ele pediu-me colinho, sentei-o e ele começou a esticar o body e a dizer que estava muito apertado, nesse momento, começou a vomitar, vomitou sem parar como nunca tinha visto. Chamei os meus pais e disse que íamos para o hospital.
Chegamos ao hospital e o nosso pesadelo começou.
Recebemos pulseira verde, a médica só deixou entrar um familiar e expulsou o homem do gabinete, disse-me que o antibiótico ainda não tinha tido tempo de efeito e que ia pedir análises à urina e que ele tinha que beber um soro, para garantir que não estava a desidratar.
Fomos chamados pela enfermeira, para lhe pôr um saquinho para recolher a urina, ele chorou e chorou, a enfermeira meteu mal o saco, avisei-a, limitou-se a olhar para mim e mandou-me sair do gabinete.
Tentamos de todas as maneiras, durante três horas fazer com que ele bebesse a aquela porcaria de soro que cheirava a laranja, algo que segundo a enfermeira maravilha deveria ter sido feito em meia hora, bebendo uma colher de soro a cada cinco minutos. O tal saquinho para a recolha da urina descolou-se e voltamos ao gabinete e disse às outras enfermeiras o que se passava, que o saco ficou mal posto e que ele não bebia o soro, disseram-me que ele tinha que estar quieto para o saco não se descolar, e que lhe iam dar chá em vez de soro.
Tentei a todo o custo mante-lo quieto, e quanto ao chá foi exactamente a mesma coisa que a merda do soro, não o bebia por nada. O homem já estava farto e resolveu tocar à campainha do consultório para falarmos com a médica, aquilo já era demais, já lá estávamos à quatro horas, o Salvador, tinha fome, tinha sono e aquilo não podia continuar. Entretanto uma enfermeira sugeriu-me que lhe tentasse dar um pouco de Ice Tea, e foi o que lhe consegui dar, um pouco de Ice Tea.
Fomos chamados pela médica, uma outra médica, uma médica simpática, que sabia exactamente o que os pais estão a passar em momentos como aquele, não expulsou o homem do gabinete, em vez disso pediu-nos desculpa por não ter visto o nosso filho mais cedo, e explicou-nos que tinha crianças muito doentes no S.O. e que esteve primeiro a tratar delas, também nos disse que o antibiótico que receitaram para a lontra ia demorar a fazer efeito, e que ela ia receitar uma medicação intravenosa para ele fazer, e que ele não ia necessitar fazer mais antibiótico e que nos podíamos ir embora.
O meu mundo caiu, eu tenho pavor de agulhas, eu desmaiou quando vou tirar sangue e o meu filho ia ter que estar com uma agulha na mão a fazer medicação....
Entramos novamente no gabinete das enfermeira, o homem que sabe da minha relação com as agulhas, disse-me para sair, disse-lhe que não saía dali. Assim que o deitei na maca começou a chorar, a chamar por mim, a gritar e a tentar soltar-se, a enfermeira deve ter-lhe espetado a agulha dezenas de vezes, rebentou-lhe as veias de ambos os braços, ele chorava e eu chorava com ele.
Pedi para o acalmar um pouco, peguei nele ao colo e ele calou-se logo, o homem disse para eu me sentar que estava branca, a enfermeira disse para eu sair e respondi-lhe que não, que só saia dali com o meu filho! Então ela foi buscar um lençol para o enrolar, disse-me sem nunca olhar para mim que tinha que o manter quieto, que a culpa de ter rebentado as veias era dele, como é que é possível um mulher como aquela trabalhar numa especialidade como pediatria?! Ela trabalha com crianças, o meu filho tem dois anos, por muito que lhe explicasse o que estava a passar, ele não entendia, só tem dois anos, na cabeça dele, aquela mulher estava-lhe a fazer mal e os pais estavam a permitir... ao voltar a deita-lo na maca, pedi-lhe desculpa, pedi-lhe que me perdoasse por lhe estar a fazer aquilo, ela voltou a pica-lo, rebentou-lhe mais veias, ele chorava e gritava, eu chorava e pedia-lhe desculpa, falava-lhe na tia e na gata, no mickey e em desenhos animados que vocês provavelmente nem sabem que existem, o homem não aguentou e teve que sair, entrou a minha mãe, a enfermeira gritou-lhe para ela se ir embora e eu gritei-lhe que aquela era a minha mãe!
Os médicos que estavam no S.O vieram ajudar a mante-lo quieto, estavam cinco pessoas a tentar mante-lo quieto quando a nossa médica entrou na sala e mandou a enfermeira afastar-se, que ela é que ia fazer o procedimento.
Na primeira tentativa a agulha entrou, colou-lhe agulha com fita adesiva e disse-me para o pegar ao colo e me ir sentar com ele. O homem entrou na sala e sentou-se connosco e pediu-me desculpa por ter saído, disse-lhe que era natural, que era o nosso filho e que nunca deveríamos ter que ver um filho sofrer... ele disse-me que eu tinha uns tomates de aço, rimo-nos e falamos de coisas estúpidas e sem nexo enquanto a lontra dormia ao meu colo e fazia a medicação.
O Salvador já está melhor, neste momento está aqui à minha frente a brincar com os carrinhos, enquanto o homem dorme no sofá, estão todos exaustos e não tem sido fácil convence-lo a comer, mas temos conseguido.
A maternidade não é uma coisa fácil, tem coisas fantásticas, mas tem outras...
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Opiniões extremamente brilhantes e fantásticas